A BENZEDEIRA

A cidadezinha, era pequena, daquelas que o leiteiro passa na porta com o leite que acabou de ordenhar, o peixeiro com os peixes pendurados num pedaço de ripa, o lixeiro na carroça.

O sino da igreja  era, para todos, o relógio! Se tocasse fora de  hora, alguém tinha morrido.

Lá vivia uma pessoinha muito importante  para a cidade. Ela era bem idosa, gracinha de pessoa e todos a conhecíamos e amávamos.

Vestia-se de preto  ou azul marinho com florzinhas ou bolinhas brancas, sapatinho baixo preto e o cabelo, sim o cabelo, branquinho, preso num coque bem apertado, lá embaixo, perto da nuca. Ela era a benzedeira mais amada e procurada  da cidade.

Ouvia cada  pessoa, perguntava seus problemas e ai sim começava a benzer.

Nós, crianças , então adorávamos Dona Joaquina, pois ela, além de conversar, abraçar, ouvir, dividir, ainda tinha uma lata onde guardava guloseimas, que ela mesma fazia, tipo bolachinhas, maria-mole, suspiro, etc… Ela literalmente nos pegava no colo. Ah que bom foi ter vivido naquela Cidade e naqueles tempos.

Eu costumava ir lá todas as tardes . Minha mãe às vezes não queria pois achava que eu estava bem, mas eu insistia: – preciso ir. Acreditava piamente que Dona Joaquina era um anjo. Sentia-me alegre quando ia  lá para benzer.

Agora, adolescente, depois que Dona Joaquina foi para o céu, rebelde que estava ficando, afirmava  de pés juntos, que nunca mais na vida acreditaria nessas bobagens. Só um anjo como Dona Joaquina  tinha esse poder.

Na juventude continuava a achar que esse negócio de quebranto era grande  besteira.

Formei-me e namorando esqueci todo esse negócio de quebranto, mau olhado, energia ruim etc… Só pensava no namorado, de quem era muito apaixonada e também  de sua família, principalmente  da futura sogra, que também gostava e mim.

Porém … como dizia uma vizinha de casa, que era muito falante: – “a gente paga a lingua”.

A minha querida sogra era o que se chamava de benzedeira.

Eu pensava como poderia uma senhora tão fina, elegante, culta fazer isso? Pois bem…

Assim como D. Joaquina, tinha aquele carinho especial, que ajuda tanto quando de uma carência.

Era tão carismática quanto ela e assim, tão querida. Todos os dias tinham pessoas em sua casa, pedindo para que ela fizesse uma oração por elas, isto é, benzesse.

Hoje a benzedeira sou eu. Escolhida por ela para ser sua sucessora, aqui estou eu a benzer filhas, netos, filhos de amigas, netas de amigas de amigos, enfim … Paguei a lingua!

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