Arquivos mensais: junho 2015

Freud Explica

Freud estava fora de moda quando fiz faculdade. Eu só havia lido um ou outro pequeno trecho dele, nas aulas de linguística. Comecei meu estudo relendo seu livro, que trata de como nossos lapsos revelam o conteúdo do nosso inconsciente.

Quem sabe essa leitura não me ajuda a entender também meus sonhos?

Era muito estranho sonhar sempre com a mesma cena, sem continuação! Sempre o mesmo: uma escola, o toque do sinal do recreio soa alto, e todos correm em direção ao parquinho. Dirijo-me ao escorregador, meu brinquedo preferido. Subo até o ponto mais alto, paro e olho para baixo, mas não consigo ver mais nada. Quando me dou conta, já estou acordada.

Decidi que era hora de tentar entender o que tudo aquilo significava. Perguntei à minha psicóloga Caroline se ela sabia de algum livro que me ajudasse a compreender meus sonhos.

Assim, ela me emprestou seu exemplar do livro A Interpretação dos Sonhos, de Freud, e sugeriu que discutíssemos aquele assunto durante alguns encontros.

Conversando com Amy, dias depois, descobri que ela também já tinha lido esse autor, para tentar entender a si mesma. Foi essa uma das minhas maiores motivações. Passei o resto da minha semana com a cara enfiada na obra.

Sábado, no limite da exaustão, dormi com o livro no colo.

De novo, o sonho começou da mesma maneira: uma escola, o toque do sinal do recreio soa alto, e todos correm em direção ao parquinho. Dirijo-me ao escorregador, meu brinquedo preferido. Subo até o ponto mais alto, paro e olho para baixo. Pela primeira vez, consigo ver quem me faz companhia lá: Arthur, o garoto mais desprezível da escola e talvez de toda face da terra.

Lembro-me de que ele constantemente falava que eu parecia um garoto. Sempre nas horas mais impróprias, e como eu me irritava com aquilo!
Ele sobe no brinquedo, e ficamos frente a frente. Com o olhar fixo no meu, sádica e lentamente ele repete aquela frase que eu tanto odiava.
Sem pensar avanço nele, brigamos feio.

De repente, olho para baixo, e, assustada, percebo que ele já não estava comigo, e sim, na areia, imóvel. Saio correndo em disparada, para longe de tudo aquilo. Desesperada, acordo.

Suando frio, expliquei à psicóloga o meu sonho. Será que fui eu quem matou Arthur? Deve ter sido esse o motivo pelo qual eu não conseguia ver mais nada depois de um certo ponto. Essa imagem deveria estar escondida no meu inconsciente junto com a minha culpa pelo homicídio. Eu era uma assassina.

Assassina. Não importava o que minha psicóloga dizia, aquela palavra continuava a ecoar em minha cabeça. Como eu pude fazer aquilo? Matar uma pessoa! Que tipo de criança horrível eu fui? E pior, se fui capaz de tirar a vida de alguém uma vez, quem garante que já não o fiz outras vezes?

Durante horas, não conseguia pensar em mais nada. Passei noites em claro e sem ir às consultas. Não atendia o telefone, não saía de casa. Em um ato desesperado, tentei, sem sucesso, me afogar.

Tinha alucinações. Ouvia vozes. Definitivamente, eu estava enlouquecendo. Não conseguia comer, há dias não tomava meus remédios para ansiedade, minha casa estava completamente destruída.

Aflita, Caroline contou tudo à Amy, que foi até minha casa e me encontrou em estado deplorável. Com seu jeito próprio, e com muito trabalho acabou me convencendo de que o melhor a fazer, agora que a ferida já estava aberta, era encará-la de frente. Sugeriu procurar informações sobre Arthur. Acreditava que só assim eu conseguiria ficar e paz novamente.

Descobrimos, para meu grande alívio, que Arthur estava vivo. Embora mais tranquila, ainda restavam diversas questões em minha cabeça. Será que eu era louca? Problemática? Porque eu matava Arthur toda noite? Tentava obsessivamente entender de todas as maneiras, como eu havia sonhado com a sua morte se aquilo não havia acontecido.

Concluímos, baseando-nos em Freud, que aquele sonho era, na realidade, a expressão de um desejo inconsciente que eu tinha de matar Arthur. Pensamos, ainda, que Arthur podia ser apenas um símbolo de todos aqueles que me maltrataram durante o período escolar.

Fiquei mais tranquila sobre meus sonhos, mas algo maior emergiu e agora me atormenta: Afinal, quem sou eu, e quais outros desejos o meu inconsciente oprime?

 

Tati

 

 

O QUADRO

Italiana, daquelas que nunca perdeu o sotaque. 50 anos de Brasil. Nunca quis ser chamada de avó ou vó. Tinha que ser nona.

Chamava as netas de bambina, a massa de pasta e amor para ela era amore.

Casou-se jovem, claro que com um italiano. Tiveram uma filha e viveram felizes por um bom tempo, até que ele partiu. Dramática como só os italianos sabem ser, chorou, chorou, chorou. Até que um dia parou de chorar e pensou: Vou aproveitar la vita. Como? Indo para La Bella Itália. E assim foi. Anos e anos a fio, idas e vindas.

Como tinha sido alpinista na juventude, um amigo presenteou-a com um belo quadro (pintado por ele) representando a montanha com neve etc…etc., Ela adorava o quadro. Pendurou no melhor lugar de sua sala. Quem a fosse visitar, seria impossível não vê-lo, tinha que ouvir toda a história do quadro.

Seu genro, que gostava muito de brincar com ela, vivia dizendo: bela obra de arte, mas se ela lhe desse o quadro e mais mil reais, ele não aceitaria, talvez o quadro e mais dez mil reais, ele iria pensar no caso. Ela sempre ríspida respondia: Questo quadro non tem preço. Sabia que era gozação, mas ficava irritada. Assim mesmo.

Ao completar 96 anos achou que era hora de sossegar e mudou-se para a casa da filha, e por lá ficou mais algum tempo, porém sem desmanchar sua casa. Pensava “e se lá de repente não me dou bem…”. Sempre lúcida e com sotaque, chamava sua filha de bella!

Nunca perdeu a lucidez. Nem seu gênio irracível.

Um dia sua filha querendo agradá-la sugere: Vamos trazer o quadro da montanha e colocá-lo no seu quarto assim… Bella, não conseguiu terminar a frase, e já veio a resposta: Ma filha io nem morri e você já está desmanchando tuta la mia casa?

PERGUNTAS FILOSÓFICAS

– Do funileiro, dando orçamento para consertar um amassado do carro  ̶  o senhor quer serviço fino, mais ou menos, ou uma cagada?

– Da namorada para o namorado   ̶ você quer casar comigo?  ̶ como assim…casar?

– Dos avisos:  ̶  tenho duas notícias uma ruim e outra pior, qual você quer saber primeiro?

– Do fora do namorado – mas por que você quer terminar?  ̶  não é nada com você, estou mal, confusa comigo mesma, você entende?

– Da desculpa bem sacada  ̶  você olhou para a bunda daquela piranha?  ̶ não meu bem estava olhando para atravessar a rua. Você quer que eu seja atropelado?

– Da moça bonita e gostosa que entrou na secção masculina de um magasine e perguntou para o vendedor  ̶  se o senhor fosse meu namorado o que gostaria de ganhar de presente?

– Na barraca de ovos na feira  ̶  a senhora quer ovos de granja ou caipira?– O que? Caipira bota ovo?

– Do rapaz que acabou de ser salvo de um afogamento  ̶  o senhor aceita um copo d´água?

– Do apaixonado para a sua musa  ̶ quero amá-la. ̶ Por que? Você vai viajar?

– Da gorda comendo bolo de chantili com a boca lambusada – o senhor está servido?

– Da moça que teve sua bolsa assaltada. – Seu ladrão, o senhor pode me deixar R$20,00 para eu tomar um taxi até a delegacia?

– Do pescador deslumbrado quando viu uma sereia. – Dá para você tirar essa calça lycra esquisita?