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Sorriso

Quem diria, heim? Eu lá no alto, descendo no bloco social daquele prédio gigante de vidro.

O elevador era um cômodo todo prateado, tinha até tv, uma riqueza danada.

Logo eu, que cheguei com uma mão na frente e outra atras, sem um tostão no bolso.

Me lembro como se fosse hoje, que quando saí  de Juazeiro, já na hora de subir no ônibus, mainha me disse:

Filho, sorria sempre viu? sorrir é de graça, é assim como o sol que taí de graça pra aquecer a gente.

Ah, bem que eu estava precisando de calor, naquele prédio gelado. Nasci e me criei na Bahia e foi lá que aprendi a mexer com construção, com parte elétrica.

Lembro que quando eu vim para cá, comecei a fazer uns bicos com o Seu Antônio e hoje tenho um bocado de serviço. Tenho celular, cartão, email, só não tenho “tuite”, por que ainda não entendi para que serve esse troço.

Tava fazendo um serviço em um escitório no 27 andar, quando tive que descer para receber um material na portaria. Como o elevador de serviço estava encrencado, o moço mandou descer pelo social mesmo.

Tomara que não entre ninguém, o povo pode achar ruim, pensei.

Mas não foi que nessa mesma hora o elevador parou?

Nisso entraram três doutô, fineza mesmo, de terno e graveta, e eu, como sempre faço, sorri para eles.

Desde que mainha me falou aquilo, sorrio para todo mundo, até para mim mesmo, quando me vejo nos vidros dos prédios nas avenidas.

Mas os doutô nem me viram, a modo de que estavam escrevendo no celular. Vai ver era coisa importante.

Depois entrou outra moça, com cara de chefona, mas também não viu meu sorriso não.

Me enfiei mais pro canto e fiquei torcendo praquele negócio andar depressa.

Mas aí o elevador parou de novo…

E foi então que entrou a tal moça, e junto com ela, um cheiro de flor.

Não era cheiro de perfume, era cheiro de flor mesmo.

Ela também estava com pasta e celular, só que não estava olhando para baixo igual aos outros.

Nisso ela olhou para mim, assim nos olhos mesmo, e como os outros nem olharam para ela, foi para mim que ela sorriu.

Um sorriso bonito que só vendo, igual criança. Pareceu durar o tempo de uma vida.

Nunca mais que eu esqueço esse sorriso.

Sorri também para ela e foi aí que entendi, quase cinco anos depois, o que mainha disse: Que sorriso é que nem o sol, ele aquece mesmo a gente, só que por dentro.