Arquivos mensais: janeiro 2016

DOMINGO NO PARQUE

 

            É muito chato ficar com meu pai. Normalmente ele fica lendo jornal, me ignorando.

Um domingo, por milagre, ele me levou no parque. Sentou no banco, abriu o jornal e me mandou brincar.

Sentei no balanço. Olhando em volta, vi um homem bigodudo com três meninas pequenas como eu.

O homem estava falando alguma coisa e elas riam dele. Depois, ele fez tipo um “carrinho” com uma toalha e puxava elas pela grama.

Olhei para o meu pai escondido atrás do jornal.

Depois o homem de bigode, comprou um monte de porcaria para as meninas: sorvete, algodão doce e suquinho.

Sentaram na sombra. Veio um cachorro e ele falou “passa lulu” ! achei engraçado.

As menininhas então subiram na árvore com ajuda do homem de bigode. Olhei meu pai. Estava lendo um jornal dobrado agora.

Eles estavam indo embora. O homem de bigode ainda por cima comprou uma bola para cada uma. Daquelas grandonas! Coloridas!

Olhei papai com o jornal aberto. Fiquei muito brava, ele não fazia nada de legal comigo.

Correndo fui até ele, tirei o jornal da mão dele e disse, batendo o pé:

_ Quero que você tenha um bigode agora! Entendeu agora!

 

 

Esta é uma homenagem ao homem bigodudo que é meu Pai.

AMAR

Amar é querer ficar perto se longe, e mais perto se perto – Vinicius

Amar não é olhar um para o outro.  É olhar juntos na mesma direção – S. Exupery

Amar é sorrir por nada e ficar triste sem motivo – Camus

Amar dói tanto que você fica humilde e olha de verdade para o mundo – T. Bernara

Amar uma mulher é fácil. Conviver é mais difícil. Entendê-la é impossível

Amar desde o princípio da sua vida até o final da sua história.

Amar a primeira vista é possível. Mas é sempre bom limpar os óculos e ter um segundo olhar.

Amar é como ter um pássaro no dedo. A qualquer momento ele pode voar – Rubens Alves

Amar é metade de crer.

Amar uma pessoa significa querer envelhecer com ela – Camus

Amar é ultrapassarmo-nos.

Amar uma mulher pela metade não existe, tem-se que amar o pacote completo.

Amar é admirar com o coração – Grotier

Amar é uma loucura completa. Não tem motivo. Não tem explicação. Nada tem de racional. Quem ama é louco.

Amar é o inverso de odiar. Mas a distância entre eles é pequena.

Amar, amar, amar, respeitar, respeitar, respeitar, paciência, paciência, paciência, isto é amar.

Um conto de Natal

As amigas diziam que era uma grande bobagem, afinal, passar uma noite de Natal com a família não deveria ser motivo de preocupação. Que nada. Quando começava a se aproximar o final do ano, ela já começava a se perguntar: quanto tempo ainda tenho para arranjar um namorado?

Não era por carência, a vida dela, ainda que algumas vezes solitária, era até que bem feliz. Não é que ela nunca tivesse ninguém. Homens interessantes e interessados apareciam, alguns namoricos engatavam, o problema é que nunca se firmavam. Alguns até duravam meses, mas nunca chegavam até as festas de fim de ano – período crítico para as pessoas que estão sós.

No Natal era quando a sua família se reunia, todos felizes – ou aparentemente felizes – por se reencontrarem. Era a noite de saber das novidades do ano que se passou. As primas eram todas casadas, e a cada ano, um novo bebê era apresentado. Que fofo, não é a cara do pai? Todas tinham muitos filhos. E todas tinham seus maridos – pelo menos até então – enquanto ela nunca chegou a apresentar um namorado. Até a sobrinha, que ainda ontem era uma criança, no último Natal chegou acompanhada,  e pelo que a mãe dela falava, o namoro seguia firme.

As tias, sem perceber o constrangimento que a pergunta trazia, já chegavam com um sorriso. “Linda, e os namorados?” Nesse momento, um misto de embaraço, tristeza e sentimento de incompetência a dominava. Lamentar publicamente a situação, nem pensar. O jeito era sorrir e disfarçar.

Nesse ano, ela já havia se preparado para enfrentar novamente aquele ritual. Não existia o movimento dos sem-terra? Ela poderia fundar o movimento dos sem-filhos, pensou divertida. Resignada, tinha acabado de passar o batom – sempre seu último preparativo antes de sair de casa- quando a campainha tocou. Quem seria? Abriu a porta. Deu de cara com um homem alto, lindo, de cabelos escuros, olhos verdes, muito bem vestido e sorrindo para ela. Vamos?

Sem entender nada, mas querendo muito acreditar que aquilo estivesse realmente acontecendo, ela apenas respondeu: vou pegar as chaves do carro. No caminho ele falou amenidades. “Será que seu tio vai gostar desse vinho?” Sim, para completar ele havia trazido um presente para o anfitrião. “Sabe que esta é uma ótima safra?” . Parecia que o homem perfeito tinha se materializado.

Ela não ousava questionar: mas quem é você afinal? A única pergunta que teve coragem de fazer foi perguntar o nome dele. Gabriel.

Foram recebidos pela família com muitos sorrisos e abraços – como sempre acontecia. A diferença é que havia uma certa eletricidade diferente no ar. Todos pareciam encantados com o charme e a simpatia do Gabriel. Uma prima não se conteve e revirando os olhos comentou: “ Prima, que guapo, parabéns!”.

A noite foi perfeita, como um sonho. Gabriel estava carinhoso com ela, como os homens apaixonados geralmente são. Mexia no seu cabelo, falava baixinho no seu ouvido, ria muito e lhe servia vinho – que o seu tio adorou. “Esse é dos bons!”.

Fim de festa, todos se despediram e os olhares entre os familiares eram de total aprovação.  Entraram no carro e mais uma vez ela não ousou perguntar nada. Chegaram na casa dela, Gabriel deu-lhe um longo beijo e falou: tenha uma feliz noite de Natal. E sorrindo, partiu.

Até hoje ela se pergunta como aquilo aconteceu. Depois de imaginar milhões de teorias, desistiu de tentar entender.  Ah, que diferença faz? Tinha sido tão bom!

Deve ter sido a tal magia do Natal.

 

 

 

 

A GALINHA E O SAPATO

Por Sandra

 

Um dia nossa galinha branca apaixonou-se por meu sapato dourado de festa. Ela passava o dia todo ali, empoleirada dentro da sapateira, como que chocando os ovos de ouro.

 

Um certo dia resolvi fazer uma limpeza e joguei fora alguns sapatos velhos. O dourado foi junto. Só percebi a besteira que havia feito depois de ver a coitada da galinha branca correndo em volta da casa, cacarejando que nem uma louca. Tarde demais, já devia estar no lixão.

 

Esse amor improvável era realmente verdadeiro. Essa galinha faltou morrer: não comia, não bebia, não botava. Entrou no poleiro do quintal e lá ficou.

 

Todos na fazenda se condoeram. Quem nunca havia sofrido por amor?

Até no lixão os peões foram tentar encontrar o sapato. Mas nada.

 

Me senti muito culpada. Fui até a cidade e comprei outro sapato dourado. Ajeitei ao seu lado no poleiro. Ela saiu correndo ofendida, e só entrou quando os tirei de lá.

 

Todo dia íamos checar, e ela estava sempre lá, empoleirada, imóvel, como que resguardando o luto. Lhe demos o apelido de “viuvinha”.

 

Passaram-se dias e uma bela manhã, a galinha viúva não amanheceu no poleiro.

 

A notícia se espalhou, ficaram todos preocupados, onde estaria a viuvinha? Morreu? Como? Coitadinha… procuramos pela fazenda toda e nada…

 

Os dias passaram e, na lida diária, acabamos nos esquecendo dela.

 

Mas a vida é cheia de surpresas e numa bela manhã, quando um dos peões abre o seu armário, vê dois olhinhos muito brilhantes lá no fundão. Retirando toda a tralha vê, com alegria, a viuvinha toda feliz aboletada ao lado de suas velhas botas de couro.

Ele, o peão, sábio das coisas do amor sussurra:

-“É, guria… um amor só se esquece mesmo com outro…

 

80 ANOS DO MEU AVÔ

 

Meu avô, como eu, é muito exato.

Sua vida é baseada em números:

1 é o número máximo de cachorros que ele tolera;

2 vezes ele tentou consertar a bruxinha;

3 vezes ele me deu a mesma boneca (nenê nova);

4 metros de altura era quando eu achava que ele media – até o ano passado;

5 é o número de netas;

6 (-1) é o número de netos;

7 dias passamos no bazolles com direito a mel do ursinho e baguete todos os dias;

8  quando eu tinha essa idade ele decidiu me ensinar o sistema binário dos computadores;

9 (+1) é de acordo com ele, o número de músicas que tem que saber tocar no violão para não passar vergonha;

10 reais é o quanto a gente ganha para acertar o número de pacotinhos de açúcar;

50 algarismos do (número pi) ele sabe falar a qualquer momento – mesmo que não estejam certos;

100 vezes ele ficou decepcionado com o Corinthians;

1000 vezes ele ficou feliz (c/o time);

Infinito – mesmo que não seja um número concreto – é meu amor por ele.

                                                        Tatiana