Arquivos mensais: fevereiro 2017

OVO FRITO

Leio num conto de Rubens Alves que alguém está revindicando uma indenização  pelos ovos fritos que deixou de comer.

Explico: Há cerca de cinco ou mais anos, os cientistas que estudavam alimentação humana, chegaram a conclusão que o ovo era o grande vilão para as doenças  do coração, uma verdadeira bomba relógio no colesterol. Ingeri-los era um suicídio. Diziam mais, que ovos, só os de páscoa(chocolate) ou aqueles que os russos fazem para decoração.

Depois de alguns anos os cientistas chegaram a conclusão que não era bem assim, que o ovo é um excelente alimento, pouco altera o colesterol. Enfim o ovo estava liberado.

Se isto for verdade, também vou querer uma indenização. Nos últimos cinco anos, deixei de comer meu ovo frio, pelo menos duas vezes por semana. Como o ano tem  52 semanas, deixei de comer 104 ovos por ano, se contarmos os últimos 5 anos, dará 520 ovos!

Deixei de me deliciar com 520 ovos fritos nesse período.

Aquele ovo frito com a clara com as bordas tostadinhas e a gema inteira, que a gente vai comendo pelas beiradas  até chegar no momento supremo  de quebrar a gema, que  vai escorrendo devagar,  no meio do nosso prato  de arroz e feijão. Então a gente molha o pão naquela gema e vai se deliciando! Depois  mistura-se com o arroz e feijão… e lentamente vai-se comendo tudo.

Já pensou perder esse prazer 520 vezes? Quero também uma indenização.

Agora, não podemos esquecer que fazer um ovo frito, bem feito, exige da cozinheira muita competência  e conhecimento. Ter que comer um ovo que estourou a gema  na hora de fritar é como comer um bombom sem tirar o papel.

Quando eu era adolescente  todo dia  de manhã minha mãe fazia para mim um ovo quente. “É bom para o crescimento” dizia ela. Não sei, por que ela dava também para o meu pai, que  já era bem grandinho.

Outro dia  conversando com uma amiga, disse a ela que eu na cozinha era zero , e acrescentei, nem ovo frito eu sei fazer, só cozido. Pois não é que ela começou a me ensinar como fritar um ovo Logo eu? Ainda argumentei: – “na cozinha existem dois tipos de pessoas: as que sabem cozinhar , e as que batem palmas. Eu sou do segundo grupo”.

Agora estou pensando em pedir as indenização de 1040 dólares, dois dólares por ovo. Vai dar para cobrir meu cartão de crédito no fim do mês, e talvez o da minha mulher também… ( MAS ACHO DIFÍCIL)

A BENZEDEIRA

A cidadezinha, era pequena, daquelas que o leiteiro passa na porta com o leite que acabou de ordenhar, o peixeiro com os peixes pendurados num pedaço de ripa, o lixeiro na carroça.

O sino da igreja  era, para todos, o relógio! Se tocasse fora de  hora, alguém tinha morrido.

Lá vivia uma pessoinha muito importante  para a cidade. Ela era bem idosa, gracinha de pessoa e todos a conhecíamos e amávamos.

Vestia-se de preto  ou azul marinho com florzinhas ou bolinhas brancas, sapatinho baixo preto e o cabelo, sim o cabelo, branquinho, preso num coque bem apertado, lá embaixo, perto da nuca. Ela era a benzedeira mais amada e procurada  da cidade.

Ouvia cada  pessoa, perguntava seus problemas e ai sim começava a benzer.

Nós, crianças , então adorávamos Dona Joaquina, pois ela, além de conversar, abraçar, ouvir, dividir, ainda tinha uma lata onde guardava guloseimas, que ela mesma fazia, tipo bolachinhas, maria-mole, suspiro, etc… Ela literalmente nos pegava no colo. Ah que bom foi ter vivido naquela Cidade e naqueles tempos.

Eu costumava ir lá todas as tardes . Minha mãe às vezes não queria pois achava que eu estava bem, mas eu insistia: – preciso ir. Acreditava piamente que Dona Joaquina era um anjo. Sentia-me alegre quando ia  lá para benzer.

Agora, adolescente, depois que Dona Joaquina foi para o céu, rebelde que estava ficando, afirmava  de pés juntos, que nunca mais na vida acreditaria nessas bobagens. Só um anjo como Dona Joaquina  tinha esse poder.

Na juventude continuava a achar que esse negócio de quebranto era grande  besteira.

Formei-me e namorando esqueci todo esse negócio de quebranto, mau olhado, energia ruim etc… Só pensava no namorado, de quem era muito apaixonada e também  de sua família, principalmente  da futura sogra, que também gostava e mim.

Porém … como dizia uma vizinha de casa, que era muito falante: – “a gente paga a lingua”.

A minha querida sogra era o que se chamava de benzedeira.

Eu pensava como poderia uma senhora tão fina, elegante, culta fazer isso? Pois bem…

Assim como D. Joaquina, tinha aquele carinho especial, que ajuda tanto quando de uma carência.

Era tão carismática quanto ela e assim, tão querida. Todos os dias tinham pessoas em sua casa, pedindo para que ela fizesse uma oração por elas, isto é, benzesse.

Hoje a benzedeira sou eu. Escolhida por ela para ser sua sucessora, aqui estou eu a benzer filhas, netos, filhos de amigas, netas de amigas de amigos, enfim … Paguei a lingua!