Zé Girafa

Era magrinho, muito alto, esguio, pescoço grande, andava balançando a cabeça. Os colegas da fábrica logo o apelidaram de Zé Girafa. Sem maldade, foi muito bem escolhido. Trabalhava na manutenção de máquinas e equipamentos. Era um excelente profissional, competente, criativo. Tinha porém um temperamento de cão. Sempre mau humorado, tinha uma resposta para tudo.

Os colegas sabendo disso o gozavam. Quando ele andava pela fábrica:  “Vai Girafa!” e vinha a resposta: “Girafa é …(um palavrão)!”, para  delírio da peãozada. Mas tanto insistiram que ele acabou assumindo o apelido e passou ele próprio a se auto denominar Girafa. Aí acabou a graça, ninguém mais brincava com isso. O mau humor porém continuava. Se estivesse consertando alguma coisa e um auxiliar deixasse cair uma ferramenta no chão, um martelo ou um alicate, lá vinha o Zé Girafa :  ” Ainda bem que você não está trabalhando num barco”.

Quando o engenheiro da fábrica pedia para ele fazer algum serviço, ele começava a reclamar: ” Quando dá certo foi ele quem fez, quando dá errado, foi o Zé Girafa!”. Outra mania sua era discutir ordens:  “Não seria melhor fazer assim?”.  Um dia o engenheiro se irritou e respondeu:  ” Oh Girafa, você está aqui para resolver problemas ou para criar caso?”.   “Para resolver problemas” respondeu indignado. Ficou queimado, com muita raiva. E assim fez o engenheiro pagar a afronta em suaves prestações diárias.

Quebrou a máquina? Lá vinha o Girafa.  “Eu avisei, temos que trocar esta peça, estava por um fio, não aguentou!”.   Quando perguntavam como conseguir outra ele não perdia a oportunidade. ” Se o engenheiro tivesse se lembrado de comprar uma peça de reposição…” envenenava sem piedade.  Aonde podemos comprar? “Não sei, pergunta para o engenheiro!”.  Assim fazia sempre.

A noite quando chegava em casa, quase não conversava. Assistia TV e a mulher reclamava que não falava nada. E ele respondia, sussurrando, que não tinha mais forças depois de tudo que já havia falado na fábrica. Mas quando desligava a TV e pegava o seu cavaquinho, se transformava.

As mãos calejadas conseguiam tirar um som maravilhoso do instrumento. Tocava. Solava. A mulher chegava perto e começava a cantar baixinho. Nesses momentos ele sorria, sonhava. Às vezes seu compadre Mané, seu vizinho, aparecia com o violão e eles faziam uma dupla: Mané e Girafa.  Outras vezes formavam um trio, com a sua mulher cantando.

A mulher adorava vê-lo tocar. Afinal ele a conquistou com uma serenata em sua janela. Compôs até um chorinho para ela. Mais tarde ele guardava o cavaquinho, abraçava e beijava a mulher, feliz da vida, e iam dormir. Quem visse essa cena, não acreditaria que este era o mesmo Girafa mau humorado.

Todo homem tem seu ponto fraco, aquele que em momentos mágicos consegue colocar alegria e felicidade na sua vida.

Autor: Geraldo Romano

 

 

4 comentários sobre “Zé Girafa

  1. Eu estou achando que esse Zé Girafa tem um lado meio autobiográfico, lembrei do autor tocando violão na sua casa, feliz da vida!

    Ah, só que ele, no caso, é engenheiro e nem é tão mal-humorado!!

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *